Perdida no Mundo – como me senti sem celular
Atualizado: 4 de fev. de 2020
Por Maria Eugenia
Há dez dias, fui fazer uma visita à minha filha que mora nos Estados Unidos. Fiz meu check-in e me encaminhei para o portão determinado, dentro do planejado. Acomodei-me numa cadeira, à espera da chamada para embarque. Foi quando dei-me conta de que estava sem meu celular, esquecido dentro do carro ou talvez em casa. Achava que tinha colocado no bolso e… nada. Vasculhei minuciosamente a mochila, em pânico. Já havia passado pela imigração, não podia voltar e mesmo que o fizesse, como comunicar-me com meu funcionário para que retornasse, caso o telefone estivesse no carro?

A sensação de desamparo e insegurança que comecei a sentir foi terrível. Era como se estivesse “nua”, sem meu principal adereço. Indo além, o que fazer, até a hora do voo? Em volta, todos ocupados dedilhando em suas redes sociais. Não costumo também puxar conversa com estranhos – não é do meu feitio. Tinha levado uma revista que depois de quinze minutos, já conferira até as notas de rodapé. Prometi a mim mesma nunca mais viajar sem um livro. Primeira lição.
A gente não percebe mas não há mais relógios disponíveis, em locais visíveis. O celular supre este detalhe. O painel do portão de embarque indica o horário do voo mas não que horas são. Quanto falta para chamarem os passageiros? As pessoas no entorno, mergulhadas no mundo virtual, mal se olham – pouquíssimos conversam e praticamente ninguém mais usa relógio de pulso. Assim, quem não tem celular fica desligado do tempo. Segunda lição: viajando, leve relógio.
Sem que eu soubesse, o Mello – meu funcionário que havia me levado ao aeroporto – logo percebeu o aparelho caído entre os bancos do carro e voltou correndo para o balcão da companhia aérea. Esforço inútil pois apesar de um milhão de argumentos, não conseguiu que ninguém fosse entregar-me o celular e nem mesmo anunciar no alto-falante para que eu tentasse voltar para resgatá-lo. Regras de segurança – compreensíveis mas para quem esquece algo, terríveis.
As consequências do meu esquecimento eram muitas. Como iria falar com minha filha, na chegada, para marcarmos um ponto de encontro? De modo geral, ela não para o carro no estacionamento – passa no terminal correspondente à companhia aérea e pronto…
Graças a Deus tinha anotado num papelzinho, dentro do passaporte, o endereço e telefones dela – já repararam como, depois do advento do celular, pouquíssimos são os números que memorizamos? No meu caso, quase nenhum e mesmo assim, os poucos decorados eram inúteis naquelas circunstâncias…
Aguardando a mala, pedi a dois passageiros brasileiros se podiam fazer uma ligação para mim, pelo Whatsapp, claro, mas sem sucesso. Como é difícil contar com a boa vontade alheia…
Resolvi ficar sentada no saguão do desembarque pois era um ponto fixo que minha filha teria como referencial lógico. A esta altura ela já tinha ligado para o meu telefone, o Mello atendeu e avisou que eu estava sem celular – mas disto eu não tinha como saber.
Telefone público… poderia ser uma opção. Olhei em volta e vi um balcão de informações. Fechado, é claro. Encostado nele, um senhor com uma placa nas mãos, esperava um passageiro. Dirigi-me a ele e perguntei se sabia onde encontrar um telefone. Deve ter percebido minha ansiedade pois imediatamente perguntou-me para quem queria ligar, digitou o número e entrei em contato com minha filha, dando minha localização. Como fiquei grata àquela pessoa desconhecida, solícita e educada. Compensou a atitude das anteriores. Lição três: continue acreditando no ser humano.
Durante minha estadia, só tinha comunicação com o Brasil através do computador da casa – podia checar e-mails e facebook. Nos locais que visitávamos, tinha que ficar de olho na minha filha para que não nos perdêssemos. Muito estranha esta sensação.

À noite, voltei a ler para embalar o sono, ao invés de conferir mensagens e vídeos. Vi séries na TV.
Como vivi tantos anos da minha vida sem celular e de repente um simples aparelho passou a fazer parte integrante e indispensável de mim? Foi um aprendizado, uma desintoxicação de notícias. No terceiro dia já estava livre, esquecida por assim dizer do meu companheiro. Adaptei-me a manter sempre contato visual com quem eu estava.

Ao chegar de volta e segurar nas mãos aquele “amigo” deixado para trás, senti um alívio imenso! Pronto, eu estava conectada novamente. Mais de seiscentas mensagens para serem abertas…
Matada a saudade, ficou a certeza de que podia, sim, viver sem celular – uma pausa que me permitiu ficar ligada na realidade do meu entorno, de usar outros recursos, de olhar a vida através dos meus olhos e não das lentes de uma máquina.

Lição quatro: na próxima, tomarei cuidados extras…